terça-feira, 2 de setembro de 2014

CRÓNICA DA PRIMEIRA DILIGÊNCIA DO ANO (TERRIBILIS)…

Oliveira de Azeméis, Secção de Comércio da Comarca de Aveiro... 2 de setembro de 2014, às 14.00 horas, lá estava eu (para acompanhar a Colega que me deu o privilégio de me querer por patrono, na segunda tentativa de primeira diligência como advogada estagiária – ser patrono também tem destas coisas).

Primeira parte, a oficial de justiça:
– Senhores doutores, estamos com um problema: não há Habilus e o não se encontra o processo físico; mas nós estamos à procura, podem aguardar?
– É claro que podemos!

Segunda parte, no corredor, outra oficial de justiça:
– Ó senhor doutor, nem imagina o que nós temos trabalhado: ele é fazer limpezas, ele é carregar processos do rés-do-chão para o primeiro andar, ele é ordenar os processos [lembrei-me eu que sem elevador], isto tem sido um caos… e a gente vem trabalhar até tarde e está a escola para começar e os filhos em segundo plano; ainda agora estamos a começar e está tudo a ficar de rastos.

Terceira parte: afinal, o processo tinha ido parar à Secção de Execução quando o camião do Exército o trouxera para o burgo novo onde se havia de instalar em vez de ir para a de Comércio e a senhora funcionária vinha (literalmente esbaforida) com ele na mão, mas com um sorriso aberto de quem fizera o possível e mais que o exigível para que a coisa se fizesse.
Nisto, e com toda a gente a procurar o processo (magistrada inclusive), eram 15.30 horas…

Quarta parte, o gabinete da senhora Juiz: bendita adequação formal, bendita magistratura que se preocupa mais com o cidadão que com o seu conforto: “está cá o insolvente [que viera de longe, de Espinho], está cá o senhor administrador, estão cá os senhores doutores, a diligência faz-se: do resto logo se há de tratar”.

E assim foi a minha primeira diligência neste ano que adivinho terrível.
E a primeira de sempre da Colega que está a estagiar comigo… triste batismo, minha cara.

Percebi algumas coisas que me deixaram de rastos:
1. os processos ainda estão por distribuir (ou seja, não sei se o meu processo ficou no Juiz 1 ou se no Juiz 2 que se fez a diligência, nem quando será lançada a ata no sistema, que ainda não funciona para ninguém naquela banda);
2. estão milhares de processos espalhados nos corredores, ordenados na medida do possível e nem armários para eles existem;
3. afinal, a Secção de Execução não funciona no Palácio da Justiça de Oliveira de Azeméis: é num edifício ao lado, mais que provavelmente arrendado a “bom” preço (com espaços recentes e públicos e parados completamente desaproveitados noutros pontos da comarca);
4. ninguém imagina sequer em que condições trabalham os funcionários naquele palácio da justiça: o calor é tremendo (então no gabinete da magistrada, valha-me a deusa) e eu nem quero imaginar como vai ser o inverno;
5. toda a gente tem noção de que o sistema vai entrar inevitavelmente em crash antes de as atualizações estarem todas feitas;
6. começa a ser unânime a opinião que isto só lá ia com uma suspensão por força de lei dos prazos em curso durante uns quinze dias;

Conclusões do dia:
a) esta “reforma” desrespeita os magistrados e os funcionários tanto quanto maltrata advogados e cidadãos; mesmo assim,
b) tem de ser feita “custe o que custar” – os obstinados são mesmo assim;
c) e vai custar muito a todos!;
d) mas isso só será possível pela enorme qualidade (técnica e humana) que têm os nossos magistrados e os funcionários que com eles trabalham;
e) não fora termos essa circunstância feliz e, para além da reforma nem sequer ter podido começar, com certeza seria tremendamente mais penosa para os cidadãos;
Chegado ao escritório, o Citius não abre, eu sinto que não tenho pachorra para mais que isto hoje, tal é a falta de sensibilidade e a ausência de humanismo na condução desta desgraça e tomei uma decisão:
– vou ver o mar: parado por parado, sempre acalma, em vez de enervar... assim como assim, foi mesmo desta que deixei de acreditar em "sebastiões"...

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