quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Partisan... se do Justo e necessário, SEMPRE!

 


O meu dia de aniversário seria dai a uns dias…
Hoje, sem orgulho, confesso que aquele puto de quinze anos que eu era sentiu uma inveja tremenda daqueles tipos que eu não sabia exatamente quem eram, e que, no dia 11 de março de 1992, fizeram chegar ao Portugal em que eu tive o privilégio de nascer a gravação da ameaça que ainda hoje ecoa em mim, de vez em quando: “This is Papa Kilo Alpha India. Indonesian War Ship. You are now in Indonesian territorial seas”…
Eu ia fazer dezasseis anos daí a dias e é sem orgulho que confesso a inveja que senti daquelas dez dúzias de gente boa que, vindas de mais de 20 países do mundo e acompanhadas de um Senhor com uma coragem imensa (a maiúscula é propositada), tentaram entrar num (ainda não, mas em breve) país ocupado para ir levar flores a um cemitério onde uns bárbaros haviam matado gente, gente que merecia homenagem por muitas razões (a maior delas a de que a Vida de per si merece respeito, como merecem respeito a Autodeterminação e a Liberdade, enquanto inegáveis direitos humanos que são).
Olho para trás e sei, hoje, que aquele foi o melhor presente que tive nesse ano: uns desconhecidos embrulharam-me em papel de coragem e em fitas de ser(-se) humano o seu exemplo de ser cidadão, colocando-se em risco (e risco de vida) para chamar a atenção do mundo para a situação por que passava o Povo de Timor Leste.
Deram-me a (sempre) doce memória da “Paz por Timor”.
Sabiam que não iam entrar e que aquilo não seria mais do que um ato simbólico? Claro que sabiam! Mas sabiam também que assim conseguiam pôr Timor Leste e o massacre do cemitério de Santa Cruz nas bocas do mundo…
E saberiam do orgulho que um Portugal solidário, fraterno, preocupado com os Direitos Humanos teria deles? Estou francamente convencido de que sim, mas também de que isso era a única coisa que não os motivava: importava era fazer o que podiam pelo Bem, numa missão que tinha tanto de justa quanto de necessária a um tempo em que nem toda a gente se apercebera de que Timor merecia estar nas bocas do mundo.
Olho para trás e compreendo o que com quinze anos não tinha como compreender: o grau de coragem que se exige a um Ser Humano para ali estar é quase sobre-humano. E não tenho a certeza de que teria a coragem de me pôr em risco de vida se a oportunidade de ali estar se tivesse proporcionado.
Prefiro, talvez, pensar que sim e que, se tivesse podido, estaria a bordo de um dos barcos da flotilha que, com toda a razão, chamaram de “resistência”.
Inseguro dessa (minha) coragem, porém, posso dizer que sinto pela Senhora Deputada Mariana Mortágua, pela Senhora Atriz Sofia Aparício e pelo Senhor Miguel Duarte (e, também aqui, as maiúsculas são propositadas) a mesma admiração e o mesmo orgulho que senti relativamente ao General Eanes e ao Rui Marques, há mais de trinta anos: também eles fizeram o justo e necessário apenas porque era justo e necessário.
Nessa mesma insegurança, tenho, neste momento e em mim, tremendas as sensações de mágoa e de vergonha: tenho a certeza de que, se no Portugal de há mais de trinta anos, o Lusitânia Express tivesse sido intercetado, abordado e os seus tripulantes capturados pelos indonésios, o que então éramos de fraternos, solidários e filhos dos Direitos Humanos faria com que um país inteiro se levantasse em coro, num uníssono ensurdecedor em prol da sua libertação e relembrando a bravura do seu gesto…
Estava a escrever estas linhas quando soube que as Senhoras Mariana Mortágua e Sofia Aparício foram capturadas pelas forças israelitas: passei os olhos pelas redes sociais e tive verdadeira vergonha de ler coisas do género: “elas já sabiam…” ou “quem é que as mandou ir?” muito mais frequentes que palavras de apoio e esperança no seu são e inteiro regresso.
Deixámos de ser solidários e fraternos? Não creio… tenho a esperança de que é o maniqueísmo vigente que faz parecer que sim; mas, se continuarmos a dar espaço aos que nos dividiram entre os bons e os maus, tenho a sensação de que a solidariedade e a fraternidade deixarão de ser de todos e para todos.
E, sim, envergonha-me saber que, quando esse tempo chegar, terá chegado porque deixámos de ser partisans dos Direitos Humanos e dos valores da Casa (que se quer) Comum; terá chegado porque teremos deixado de ver no Outro o que ele nunca pode deixar de ser: um fim em si…
Da minha parte, cá continuarei (quando e se a coragem mo permitir) a dizer que não quero um mundo em que, seja por que razão for, o Justo tenha deixado de o ser porque era necessário a fins (em si) injustos…

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