terça-feira, 28 de outubro de 2025

Uma reflexão em torno dos resultados eleitorais cá pelo burgo...

 


Uma (às tantas) última reflexão sobre este momento tão delicioso da vida autárquica que é o eleitoral…
Obviamente, para falar da minha terra.
Estaria a mentir se dissesse que fiquei satisfeito com o resultado das eleições.
Não porque algo me mova contra o Presidente da Câmara eleito (com quem me cruzei uma vez na vida e que me deixou uma excelente impressão, como pessoa e como “trabalhador” ao serviço do PM); não que me mova alguma coisa contra a sua equipa eleita (tenho os dois seguintes - o Zé Pinho e a Carla Coelho - por bons amigos e tenho a certeza de que gostam imenso de Espinho e que farão o seu melhor; o André Guimarães pura e simplesmente não conheço).
A razão por que não gostei do resultado é mesmo uma questão de princípio(s): há anos – começam a ser anos de mais, bem sei – que ando a estudar a autonomia local e cada vez mais a entendo como essencial para a existência de uma verdadeira Democracia (e eu sou dos que precisa da Democracia como de pão para a boca). E o processo que culminou na preterição do Ricardo Sousa foi, na minha ótica e sempre no plano do(s) princípio(s), demonstração de um desrespeito pela autonomia local que dói constatar: quem demonstra não respeitar o papel das estruturas locais do partido que dirige (ou seja, ali, onde deveria ser mais fácil) demonstra não ter estrutura humane, política e democrática para respeitar o princípio da autonomia local.
Não foi, portanto, o resultado, mas o processo que me fez não gostar da composição da CME que será empossada para os próximos quatro anos.
Aliás imaginava, confessadamente, que o resultado seria este: quando o Partido Socialista prescindiu do seu “melhor ativo” para a refrega eleitoral (e fomos alguns – infelizmente insuficientes – a alertar para o facto), adivinhava-se que a divisão resultaria numa vitória do PPD/PSD em Espinho.
A partir do momento em que se montou a “tempestade perfeita”, juntando ódios pessoais ao pagamento de favores e à ambição pessoal contra os interesses de uma comunidade inteira, tornou-se inevitável uma divisão naquele que foi um amplo movimento sociopolítico em torno do PS de Espinho que começou há oito anos atrás e teve um momento bonito há quatro anos. E isso tornava a vitória do PSD inevitável.
E os números estão aí para o demonstrar: mais de metade dos votos no concelho foram para as duas listas que saíram do que foi o PS de há oito e há quatro anos (o que “talvez” desse para ganhar eleições sem a divisão, embora a matemática em política não seja só somar) e o número de aumento de votantes foi praticamente igual ao incremente que tiveram os partidos que se seguem aos três movimentos mais votados.
E, se sabia que os resultados seriam estes, admito que tinha, ao mesmo tempo, uma “secreta esperança” e um “inconfessável receio” de que, à semelhança do que aconteceu na AM, os eleitores tivessem obrigado a CME a ser um espaço de debate, de discussão, de negociação e de política a sério nos próximos quatro anos. Sob o meu ponto de vista, teria sido importante que não houvesse maioria absoluta de partido ou movimento nenhum também na CME: a minha utopia de sempre (e um conhecimento do que é a realidade de Espinho) faz-me acreditar vivamente que a terra onde nasci e na qual quero muito que os meus sobrinhos tenham futuro precisava de um resultado eleitoral de “3-2-2”, em que Presidente da Câmara tivesse de trabalhar – preferencialmente – com todos os vereadores ou, pelo menos, com duas/ois delas/es, para programar, projetar e executar. Importava neste tempo que houvesse efetivos (e não apenas propalados) respeito e consideração pelas várias visões em que Espinho se decompõe.
Não tendo sido isso o que aconteceu, desejo ao presidente da Câmara Municipal de Espinho eleito a melhor das sortes, à sua equipa o mais profícuo dos trabalhos: olhando para o que espero que seja o futuro dos meus sobrinhos, desde já lhes agradeço.
(Uma nota final, para que não restem dúvidas: não era à Maria Manuel ou ao Luís Canelas que me referia quando falei de ódios, favores ou ambição; se é verdade que são capazes desses sentimentos (e ainda bem, porque só demonstram a sua humanidade), também é facto que são demasiado humanos para se deixarem motivar na respetiva ação por qualquer um deles… um dia destes, talvez perca tempo a falar sobre isso)…
Créditos das imagens: Defesa de Espinho e site do MAI.

quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Partisan... se do Justo e necessário, SEMPRE!

 


O meu dia de aniversário seria dai a uns dias…
Hoje, sem orgulho, confesso que aquele puto de quinze anos que eu era sentiu uma inveja tremenda daqueles tipos que eu não sabia exatamente quem eram, e que, no dia 11 de março de 1992, fizeram chegar ao Portugal em que eu tive o privilégio de nascer a gravação da ameaça que ainda hoje ecoa em mim, de vez em quando: “This is Papa Kilo Alpha India. Indonesian War Ship. You are now in Indonesian territorial seas”…
Eu ia fazer dezasseis anos daí a dias e é sem orgulho que confesso a inveja que senti daquelas dez dúzias de gente boa que, vindas de mais de 20 países do mundo e acompanhadas de um Senhor com uma coragem imensa (a maiúscula é propositada), tentaram entrar num (ainda não, mas em breve) país ocupado para ir levar flores a um cemitério onde uns bárbaros haviam matado gente, gente que merecia homenagem por muitas razões (a maior delas a de que a Vida de per si merece respeito, como merecem respeito a Autodeterminação e a Liberdade, enquanto inegáveis direitos humanos que são).
Olho para trás e sei, hoje, que aquele foi o melhor presente que tive nesse ano: uns desconhecidos embrulharam-me em papel de coragem e em fitas de ser(-se) humano o seu exemplo de ser cidadão, colocando-se em risco (e risco de vida) para chamar a atenção do mundo para a situação por que passava o Povo de Timor Leste.
Deram-me a (sempre) doce memória da “Paz por Timor”.
Sabiam que não iam entrar e que aquilo não seria mais do que um ato simbólico? Claro que sabiam! Mas sabiam também que assim conseguiam pôr Timor Leste e o massacre do cemitério de Santa Cruz nas bocas do mundo…
E saberiam do orgulho que um Portugal solidário, fraterno, preocupado com os Direitos Humanos teria deles? Estou francamente convencido de que sim, mas também de que isso era a única coisa que não os motivava: importava era fazer o que podiam pelo Bem, numa missão que tinha tanto de justa quanto de necessária a um tempo em que nem toda a gente se apercebera de que Timor merecia estar nas bocas do mundo.
Olho para trás e compreendo o que com quinze anos não tinha como compreender: o grau de coragem que se exige a um Ser Humano para ali estar é quase sobre-humano. E não tenho a certeza de que teria a coragem de me pôr em risco de vida se a oportunidade de ali estar se tivesse proporcionado.
Prefiro, talvez, pensar que sim e que, se tivesse podido, estaria a bordo de um dos barcos da flotilha que, com toda a razão, chamaram de “resistência”.
Inseguro dessa (minha) coragem, porém, posso dizer que sinto pela Senhora Deputada Mariana Mortágua, pela Senhora Atriz Sofia Aparício e pelo Senhor Miguel Duarte (e, também aqui, as maiúsculas são propositadas) a mesma admiração e o mesmo orgulho que senti relativamente ao General Eanes e ao Rui Marques, há mais de trinta anos: também eles fizeram o justo e necessário apenas porque era justo e necessário.
Nessa mesma insegurança, tenho, neste momento e em mim, tremendas as sensações de mágoa e de vergonha: tenho a certeza de que, se no Portugal de há mais de trinta anos, o Lusitânia Express tivesse sido intercetado, abordado e os seus tripulantes capturados pelos indonésios, o que então éramos de fraternos, solidários e filhos dos Direitos Humanos faria com que um país inteiro se levantasse em coro, num uníssono ensurdecedor em prol da sua libertação e relembrando a bravura do seu gesto…
Estava a escrever estas linhas quando soube que as Senhoras Mariana Mortágua e Sofia Aparício foram capturadas pelas forças israelitas: passei os olhos pelas redes sociais e tive verdadeira vergonha de ler coisas do género: “elas já sabiam…” ou “quem é que as mandou ir?” muito mais frequentes que palavras de apoio e esperança no seu são e inteiro regresso.
Deixámos de ser solidários e fraternos? Não creio… tenho a esperança de que é o maniqueísmo vigente que faz parecer que sim; mas, se continuarmos a dar espaço aos que nos dividiram entre os bons e os maus, tenho a sensação de que a solidariedade e a fraternidade deixarão de ser de todos e para todos.
E, sim, envergonha-me saber que, quando esse tempo chegar, terá chegado porque deixámos de ser partisans dos Direitos Humanos e dos valores da Casa (que se quer) Comum; terá chegado porque teremos deixado de ver no Outro o que ele nunca pode deixar de ser: um fim em si…
Da minha parte, cá continuarei (quando e se a coragem mo permitir) a dizer que não quero um mundo em que, seja por que razão for, o Justo tenha deixado de o ser porque era necessário a fins (em si) injustos…